Ciclo de Conferências Revolução e Democracia – “Jornalismo, Liberdade de Expressão e Comunicação” | 28 out FCSH-UNL Torre B – Auditório 1

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Ciclo de Conferências Revolução e Democracia – “Jornalismo, Liberdade de Expressão e Comunicação” | 28 out FCSH-UNL Torre B – Auditório 12014-10-17T18:08:16+00:00

Em 40 anos, a paisagem noticiosa mudou radicalmente em Portugal e sem dúvida que a informação jornalística afirmou a sua relevância para o exercício da democracia. Numa breve memória a quatro décadas de história do jornalismo recordemos momentos de mudança dessa paisagem.

A imprensa e a transição para a Democracia

Há muitos anos que deixou de ser possível ouvir o pregão cúmplice do ardina – Lisboa Capital República Popular – que anunciava quatro jornais da tarde, nas ruas de Lisboa. Nas décadas finais do século XX o desaparecimento do Diário de Lisboa, de A Capital, do República e do Diário Popular juntou-se ao fim de muitos outros jornais que fazem parte da História da Imprensa em Portugal – e da própria História Contemporânea do país. Nas suas diferenças, recordemos outros dois títulos que circulavam em Abril de 1974: o poderoso O Século, com uma circulação nacional, uma vasta rede de correspondentes e um conjunto de revistas e de outras publicações associadas; e o modesto O Comércio do Funchal, o jornal cor-de-rosa da Ilha da Madeira que circulava no continente, dirigido por Vicente Jorge Silva, que viria a ser primeiro diretor de O Público, surgido em 1991.

Ao longo destes 40 anos, permaneceram títulos centenários como o Diário de Notícias, o jornal matutino de referência nacionalizado na Primavera de 1975 e em cuja redação se viveram nesse ano acaloradas batalhas pela liberdade de expressão. No Norte e Centro, o Jornal de Notícias liderava na ligação aos seus leitores, numa relação assente no valor da proximidade noticiosa. Em 1973, tinha surgido o semanário Expresso, dirigido por Francisco Pinto Balsemão, trazendo um outro olhar sobre a política e o país.

A consolidação do "4º poder"

A década de 1980 marca um tempo de transição no jornalismo em Portugal, como marca também a transição do país. No início desses anos, surge O Correio da Manhã, dirigido por Vítor Direito, com um grafismo, uma agenda de notícias e uma linguagem que fazem a diferença. Num outro registo editorial, anos mais tarde, a diferença aconteceria com O Independente, o semanário de vida relativamente curta mas de fortíssimo impacto político, dirigido por Paulo Portas e Miguel Esteves Cardoso. Cresce a imprensa especializada e um jornalismo cultural associado ao lazer, com perfis que vão do Blitz ao Jornal de Letras, Artes e Ideias. O jornalismo de investigação vive provavelmente a sua fase de ouro, numa convergência de meios em que o título Grande Reportagem se torna uma referência, escrita e televisiva. A TSF introduzia na rádio uma outra forma de informar, trazendo os sons, as vozes e os olhares jornalísticos sobre o “fim da rua” e “o fim do mundo”. Desde os finais dos anos 70 que a RTP2 mostrava que o jornalismo televisivo podia ir além do telejornal. Foi a década em que se formaram os primeiros licenciados em Comunicação Social e noutras Ciências Sociais, muitos deles jovens do sexo feminino, trazendo outros olhares para as redações.

SIC e TVI: o surgimento dos canais privados

A década seguinte acentua sobretudo a mudança no jornalismo audiovisual, com o aparecimento dos canais privados, SIC e TVI, e a resposta da RTP. A informação jornalística diversifica formatos, a grande entrevista e a grande reportagem consolidam-se na grelha de horário nobre, em televisão. Na imprensa, a revista Visão, surgida em 1993, renova o formato das newsmagazines até então de vida curta e permanece até ao presente. Num alargamento que vinha de trás, a atenção a tendências culturais e a matérias de sociedade (Justiça, Educação, Saúde, Ambiente, entre outros) alarga o espetro das agendas jornalísticas centradas na Política, na Economia e no Internacional.

No início do novo século, 20 anos depois da CNN, há condições para a afirmação de canais noticiosos em contínuo e feitos em Portugal, de que a SIC Notícias foi pioneira. À cadência dos noticiários horários destes canais junta-se o espaço de Comentário. Uma revolução nas formas de fazer e difundir informação surge com as potencialidades interativas da internet e outros recursos da tecnologia móvel, gerando expetativas e alimentando a imagem do “cidadão-jornalista”. Hoje, o jornalismo faz-se em plataformas múltiplas, num ambiente de convergência de meios onde impera o digital. Há muito que desapareceu a profissão do tipógrafo, enquanto se solicita ao repórter que seja mais do que alguém que vai ao terreno munido apenas de bloco e caneta. A velocidade da difusão de ‘nova informação’ é o valor dominante, as redações reduzem-se enquanto cresce o número de profissionais sem vínculo estável nem condições para receber a herança de gerações anteriores.

Jornalismo e ética

A afirmação de uma ética e de um rigor jornalístico que constrói um capital de credibilidade e confiança bem como o valor da liberdade de expressão têm em Portugal uma história inseparável da história política do país e da conturbada e interrompida afirmação da sua democracia, desde há mais de um século. Hoje, a afirmação da importância da informação jornalística para que a sociedade portuguesa seja um espaço público aberto e democrático enfrenta o desafio de fontes não jornalísticas que circulam nas redes sociais. As cores da liberdade de expressão carregam-se numa paleta de muitas tonalidades. Importa discutir o jornalismo e a liberdade expressão nas sociedades contemporâneas marcadas por meios desregulados e pela visibilidade de uma informação gerada por algoritmos.

Em 1974, Portugal passou de um regime de repressão e de censura à imprensa para um regime de liberdade de expressão, que ficou claramente expressa na Constituição de 1976 e em legislação que se seguiu – e que tem também a sua história. Este debate pode também recordar como essa liberdade de expressão foi constituída e regulada de diferentes modos, a partir dos próprios profissionais, das empresas e da intervenção do Estado.

Que futuro?

Como noutros países democráticos, o jornalismo enfrenta dificuldades: as redações estão quase vazias de memória e cresce trabalho precário e sub-emprego, enquanto os cidadãos para quem o jornalismo se dirige vivem tempos de saturação de informação instantânea e superficial, proveniente de múltiplas fontes e acessível “em qualquer lugar e a qualquer hora”. Os desafios que se colocam ao jornalismo e à liberdade de expressão têm uma escala global. Mas cada país tem a sua história e o contexto português é particularmente desafiante.

Mário Mesquita e Diana Andringa viveram estes 40 anos como profissionais da informação jornalística e protagonizaram situações que fazem parte da história recente do jornalismo em Portugal. Como jornalistas e como estudiosos do Jornalismo, a Faculdade de Ciências Sociais e Humanas orgulha-se da sua presença como oradores nesta sessão do Ciclo de Conferências.

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