ABEL SALAZAR

(19/o6/1889 – 29/12/1946)


Autoria: Teresa Lousa

Horizonte geracional

GERAÇÃO DE 1921

País

Portugal

Data e local de nascimento

Guimarães, 19 de Junho de 1889

Formação e acção

Abel Salazar realiza os seus estudos primários em Guimarães. Conclui os seus estudos secundários na área das ciências no Porto. Estuda medicina na Escola Médico-Cirúrgica do Porto onde termina o seu curso com 20 valores. Em 1918 funda e dirige o Instituto de Histologia e Embriologia, onde desenvolve uma investigação notável e pioneira na Faculdade de Medicina do Porto. Aqui é nomeado professor Catedrático, ainda muito jovem, exercendo uma actividade pedagógica moderna e invulgar para a época, privilegiando o envolvimento dos alunos no curso das investigações.

Actividade desenvolvida

Nos anos 20 o seu trabalho torna-se reconhecido internacionalmente. Representa a Faculdade de Medicina do Porto em múltiplos congressos. Desenvolve paralelamente estudos filosóficos, na área da Filosofia da Arte e do Positivismo lógico. Em parte devido à sua manifesta posição filosófica, que muito desagradou ao Regime e ao Catolicismo, será afastado da sua cátedra na Faculdade de Medicina do Porto. Esta injusta situação marcou e penalizou profundamente as investigações levadas a cabo por Abel Salazar. Não obstante, continuou a desenvolver a sua actividade pedagógica junto de pequenos grupos de intelectuais, escreve inúmeras obras científicas e filosóficas e colabora com diversos jornais e revistas (entre muitas a Seara Nova). É também nesta altura que mais se dedicará à criação artística, área onde revelará, a par das outras, o seu génio ímpar, dedicando-se a técnicas diversas como: a pintura a óleo, a gravura, a pintura mural, o desenho, a escultura e os cobres martelados.

Data e local de falecimento

29 de Dezembro de 1956, Lisboa.

Lema e linha filosófica

Sem se limitar a um único ângulo do pensamento, a sua linha intelectual estende-se da actividade científica à artística, passando pela Filosofia. Foi um problematizador da Metafísica e um divulgador do Positivismo e Empirismo lógico de influência germânica em Portugal.

Linha filosófica e caracterização geral da obra

Para além da vastíssima e intensa actividade e produção científica (relativamente à qual publicou cerca de 113 artigos dedicados a temas como o cérebro humano, a histologia do ovário, o método tano-férrico, o aparelho de Golgi e Para-Golgi), Abel Salazar foi um intelectual eclético, pensador, pedagogo, filósofo, crítico de arte e artista.

No campo da Filosofia explorou uma filosofia científica. Foi um crítico daquilo a que chama “filosofia sentimentaloide”[1] que pensava dominar o país na sua época. Podemos dizer que na sua linha de pensamento predomina o físico sobre o metafísico. A problematização da metafísica será um tema dominante na sua obra, ponto de partida para o seu empirismo, que soube integrar a escola inglesa de John Locke e de David Hume, bem como a de Bertrand Russel.

Mais do que defender um cientismo de inspiração positivista, é através de uma posição crítica alicerçada na objectividade científica que introduz em Portugal por exemplo o Relativismo de Einstein.

Como escritor e ensaísta deixou um legado extraordinário, através de obras como  “Uma Primavera em Itália”, “Paris em 1934” ou “As Recordações do Minho Arcaico”.

Na qualidade de Crítico de Arte podemos destacar os seus estudos críticos sobre o pintor Henrique Pousão, Soares dos Reis e Columbano.

Enquanto artista, foi um autodidata.  Sem aderir a correntes artísticas ou estéticas, o seu estilo foi portador de uma herança naturalista, à qual alia uma forte componente de análise da realidade que o rodeia. Apresenta uma dimensão interventiva, de denúncia e de reflexão social, nomeadamente apoiando a luta pelo direito das mulheres trabalhadoras e do respectivo direito a condições dignas e justas. Despertou consciências e alertou para questões de justiça social eminentes, num país onde reinava a opressão. Apesar de não ter nunca pertencido ao partido Comunista, por ter representado com tal acuidade o povo, os trabalhadores e as trabalhadoras, foi por este diversas vezes adoptado por este partido através das suas pinturas. Álvaro Cunhal, que foi um grande admirador seu e cuja influência se fez sentir também nos seus vigorosos desenhos, argumenta que as obras de Abel Salazar constituem uma representação realista do mundo dos trabalhadores, sacrificados pelo salazarismo, mas não alcançam uma interpretação ideológica de classe, aspecto que se coaduna perfeitamente com a posição do cientista, que sendo um indivíduo de causas sociais, nunca aderiu a causas partidárias.

Como pintor representa uma das expressões do pensamento moderno que é o neo-realismo, não integrando movimentos artísticos mais elitistas da arte sua contemporânea, como o futurismo por exemplo. Nesse sentido pretendeu ser um pintor do povo, devolvendo-lhe a dignidade através da figura da mulher trabalhadora.

A grande maioria do seu espólio artístico encontra-se na sua Casa-Museu, mas infelizmente uma quantidade considerável da sua pintura terá sido vendida pelo próprio como forma de superar as dificuldades económicas de quem perdeu injustamente o seu lugar de professor e investigador da Faculdade de Medicina do Porto.

Na sua linguagem artística predomina o anti-cromatismo, a oposição estruturante entre a luz e as trevas. Num predomínio da penumbra, Abel Salazar reserva pequenos pontos de luz para espelhar o drama da existência humana. A sua pincelada torna-se cada vez mais dinâmica manifestando a sua rapidez na execução, característica muito comum aos grandes génios da pintura.

Foi na Pintura como em outros domínios do saber um génio, com uma produção numerosíssima e complexa, mas que deixa o vazio de quem interrompe a sua produtividade demasiado cedo. Aos 57 anos o seu espírito empreendedor deixa uma obra notável e também a certeza de que muito ficou por fazer.

Bibliografia activa

Ensaio de Psicologia Filosófica, Porto: Edições da Faculdade de Medicina do Porto, 1915; reeditado pela Casa-Museu Abel Salazar e Campo de Letras Ed SA, 2001 

A Orientação Filosófica da Histologia Moderna, e seus vícios, Portugal Médico, 3º série, Vol. III, pp. 1-49, 1917

Notas de Filosofia da Arte, curso ministrado na Faculdade de Medicina do Porto, 1933, Editado pela Casa-Museu Abel Salazar e Campo de Letras Ed SA, 2000

Uma Primavera em Itália, Lisboa: Nunes de Carvalho Editor, 1934, reeditado pela Casa-Museu Abel Salazar e Campo de Letras Ed SA,  2003

A Ciência e o Mundo Actual, vol. 1, Porto: Imprensa Portuguesa, 1934

Digressões em Portugal, Vol. 1, Porto: Imprensa Portuguesa, 1935

Paris em 1934, Porto: Tipografia Civilização, 1938, reeditado em Coimbra: Edição Nobel, 1943

Recordações do Minho Arcaico, Porto: Tipografia Civilização, 1939, (reeditado no Porto, Co-edição Casa-Museu Abel Salazar e Campo de Letras Editores SA, 2001).

O que é a Arte? Coimbra: Arménio Amado Editor, 1940 (reeditado no Porto, Co-edição Casa-Museu Abel Salazar e Campo de Letras Editores SA, 2003

A Crise da Europa, Lisboa: Edições Cosmo, 1942

Um Estio na Alemanha, Coimbra: Editora Nobel, 1944

Hematologia – Ideias e Factos Novos, Porto: Portucalense Editora, S. A.R. L., 1944

Henrique Pousão, Porto: Livraria Tavares Martins, 1947

Obras completas de Abel Salazar, V.N. de Famalicão: Editora Humus, 2012

Bibliografia passiva

CASTRO, Afonso de, Notas para uma biografia de Abel Salazar, Edição da Casa-Museu Abel Salazar, 1992.

CRUZ, José, “Consideracoes Sobre a Personalidade e a Obra de Abel Salazar”, in Vértice, vol. XXI, Coimbra, 1961;

CUNHA, Norberto, Génese e Evolução do Ideário de Abel Salazar, Braga, 1990.

—, Abel Salazar, nota biográfica e bibliográfica, 1944,1990.

GUSMÃO, Adriano, A personalidade artística de Abel Salazar, Porto: Fundação Abel Salazar, 1948.

MALPIQUE, Manuel da Cruz, Perfil Humanístico de Abel Salazar, Porto, Civilização, 1977.

NOGUEIRA, Jofre Amaral – O Pensamento de Abel Salazar (Antologia), Porto: Editorial Inova. 1972.

SANTOS, Alfredo Ribeiro dos, Para um Novo Perfil de Abel Salazar, Porto: edição do autor, 1997.

SILVA, Amândio,  Abel Salazar: Pinturas, desenhos, gravuras, cobres martelados: no 1º centenário do seu nascimento, 1889-1989, Comissão Organizadora do Centenário do Nascimento de Abel Sabazar, Porto: C.O.C.C.N.A.S., 1989

—, Abel Salazar – Artista, Edição da Universidade do Porto, Câmara Municipal do Porto, Câmara Municipal de Matosinhos, Casa-Museu Abel Salazar, 1989.

SILVA, Luís Craveiro da, Abel Salazar, a universidade e a cultura, Braga : Conselho Cultural da Univ. do Minho, 1990

  1. AA., Presença de Abel Salazar, Porto, Editorial Inova Presenca, 1969;

—, Abel Salazar : nota biográfica e bibliográfica, Braga: Conselho Editorial da univ. Minho, 1990

—, O Ser e o Haver das Polémicas de Abel Salazar, Braga: Conselho Editorial da univ. Minho, 1990

—, “Ciencia,Conhecimento e Sociedade em Abel Salazar”, in R.P.F., Braga, 39 (4), 1954, pp. 337-524;

—, Abel Salazar – Retrato em Movimento, Porto: Campo das Letras – Editores S.A., 1ª. Ed., Dezembro de 1998.

 

[1] Abel Salazar- “Contra o Filosofismo III” in O Trabalho, 19/ 08/ 1937