SAMPAIO BRUNO

(30/11/1857 – 11/11/1915)

Autoria: José Esteves Pereira

Horizonte geracional

GERAÇÃO DE 90

País

Portugal

Data e local de nascimento

Porto, Rua de Santa Catarina, 30 de Novembro de 1857

Formação e acção

Autodidacta. Embora matriculado na Academia Politécnica do Porto, onde chegou a ser premiado, não conclui o curso. De seu nome José Pereira de Sampaio virá a adoptar o pseudónimo de “Bruno”, inspirado no pensador Giordano Bruno. Será sob o referido pseudónimo que publica toda a sua obra.

Actividade desenvolvida

Actividade jornalística desde 1872.Publicou o primeiro artigo no Diário da Tarde (Porto).Funda alguns jornais de curta duração (O Laço Branco e O Vampiro).Colabora em A Harpa, dirigido por Joaquim de Araújo e A Tribuna. Período intenso de tertúlia no estabelecimento familiar em que participam entre outros Júlio de Matos, Basílio Teles, Maximiano Lemos,, Manuel Teixeira Gomes, Xavier de Carvalho, na casa do republicano Silva Pinto e no Café Suiço. Em 1874, sugestionado pela obra de Pedro de Amorim Viana, Defesa do Racionalismo e Análise da Fé, publica Análise da Crença Cristã, no Porto, na tipografia de Artur José de Souza. Continuará a sua intensa actividade jornalística fundando publicações de duração efémera como O Democrata e O Norte(1881) e mais duradouro A Discussão. Essa colaboração tem vindo a ser recolhida nos Dispersos desde 2008.  ário republicano, Sampaio Bruno integraria o Directório do Partido republicano Português. Elaborou com Antero de Quental e Basílio Teles os Estatutos  da Liga Patriótica do Norte  na sequência do Ultimato de 1890.Em 31 de dezembro de 1891participou na frustrada Revolta republicana portuense sendo obrigado a emigrar para Paris de onde regressa em 1893.Em 1902, no seguimento de forte desentendimento com Afonso Costa, abandona o Partido republicano embora continue a sua actividade de propaganda da República de modo independente.Em 1909 foi nomeado Director da Biblioteca Municipal do Porto onde desenvolverá até à seu falecimento uma actividade notável.

Data e local de falecimento

11 de Novembro de 1915, Porto.

Lema e linha filosófica

Espiritualismo

Linha filosófica e caracterização geral da obra

A atitude filosófica inicial desenvolvida nas páginas da Análise da Crença Cristã é marcadamente materialista e mecanicista em enquadramento agnóstico de que rapidamente se vai afastar. Em O Brasil Mental (1898) assume uma definida posição anti-positivista a que se seguirá uma especulação pessoal de sentido espiritualista presente nas obras A Ideia de Deus(1902), O Encoberto (1904) e na obra incompleta, publicada postumamente, Os Cavaleiros do Amor ou a Religião da Razão (1961). Em oposição ao racionalismo deísta de Pedro de Amorim Viana que considerou como seu mestre, Bruno dedica o seu labor especulativo tomando como ponto de partida o problema do Mal. Deus, ser perfeito, puro e homogéneo, por um razão inexplicável teria sofrido uma diminuição, assinalada pela heterogeneidade e  originando o Mal. A sua especulação filosófica comporta uma dimensão  também sófica. Bruno aponta para a aspiração de um retorno da heterogeneidade actual à unidade e homogeneidade original mediante a progressiva espiritualização da matéria possibilitada por um libertação progressiva de todos os seres numa solidariedade cósmica em que se logre “ajudar a libertação da Natureza” com a colaboração de Deus. Assim se concretizará a unidade final reintegradora do Absoluto homogéneo. Para Bruno, Deus não é imutabilidade absoluta mas sim fieri (Deus fit, non est). Também em relação à creatio ex nihilo deparamos com as objecções mais fundas do filósofo portuense. Bruno pergunta como é que Deus, enquanto Acto Puro cria o mundo a partir do nada= negação da existência. Talvez, como hipótese, se pudesse, mais coerentemente, afirmar que Deus, no âmbito da sua Vontade e Omnipotência absolutas, criou o Mundo de nada. Todavia, não será essa, propriamente, a solução brunina mas antes a de que é no Ser que  reside a origem, principio e fundamento do ente-sendo (cosmos ou matéria), mediante uma “volição” da Vontade absoluta. Situada a questão no plano metafísico da impossibilidade e da inconsistência judeo-cristã da criação ex-nihilo teria que ser, obviamente, numa outra tradição religiosa que Bruno deveria procurar enquadramento argumentativo de resposta. Para ele torna-se, de facto, essencial a avaliação histórica de algumas concepções reprimidas, desde o catarismo, ao templarismo, da cabala à gnose antiga perso- caldaica. A adução de elementos históricos, que a imensa erudição de Bruno permitiam, tem um papel fundamental na sua argumentação, como é importante considerar também que na época em que desenvolve o seu pensamento vigora um patente descrédito, quer das soluções positivas, quer das fundamentações metafísicas várias. Assiste-se, assim, em Bruno, a uma visão de resgate, de visão progressista que produza “conhecimento” mormente de natureza religioso-teológica. Para tanto, era necessário que a metafísica fosse objecto de uma aproximação positiva tanto quanto o positivismo necessitava de se abrir à dimensão especulativa do absoluto, de tal modo que se verificasse a simultaneidade do carácter positivo, metafísico e teológico do conhecimento não positivado (embora aproveitando aqui, formalmente, o elenco comtiano dos três estados) exigindo uma cúpula ontologicamente positiva, ontologicamente metafísica e ontologicamente teológica. A visão resgatadora brunina supõe que da aparência de um retrogradar, do próprio discurso de decadência, se afirme o mundo moral. Conforme a sugestão de Victor Hugo, também para Bruno, o “mundo moral avança”. A civilização significa integração livre. Centrado na especulação sobre a essencialidade histórica de Portugal, ao particularismo sebastianista opõe Bruno a abertura a um império messiânico universal  resgatador em que o  devir se abre a uma compreensão da história na senda de uma libertação moral e de uma  “reintegração dos seres”, ou do Ser, plenamente  coerente com a sua meditação de regresso ao homogéneo primordial. É essa libertação que se anuncia através dos Cavaleiros do Amor ascendendo na posse da lenta plenitude da Razão a realizar-se lá para os fins do distante porvir. Estas meditações bruninas interessaram particularmente Fernando Pessoa.

Bibliografia activa

  • Análise da Crença Cristã (Porto, 1874).
  • A Geração Nova (Porto, 1886).
  • Manifesto dos Emigrados da Revolução Republicana Portuguesa de 31 de Janeiro de 1891, com pref. de Sampaio Bruno e Alves da Veiga (Paris, 1891).
  • Notas do Exílio. 1891-1893, (Porto, 1893).
  • O Brasil Mental. Esboço crítico, (Porto, 1898).
  • A Ideia de Deus (Porto, 1902).
  • O Encoberto (Porto, 1904).
  • Portugal e a Guerra das Nações (Porto, 1906).
  • A Questão Religiosa (Porto, 1907).
  • Portuenses Ilustres (Porto, 1907-1912).
  • A Ditadura. Subsídios Morais para o seu Juízo Crítico (Porto, 1909).
  • O Porto Culto (Porto, 1912).
  • Obra póstuma:
  • Plano de um livro a fazer-Os Cavaleiros do Amor ou a Religião da Razão, Lisboa, Imprensa Nacional-Casa da Moeda, 1996.
  • Os três frades e outros textos de ficção, Lisboa, Imprensa Nacional-Casa da Moeda, 2007.
  • Dispersos, I (1872-1879),II(1880-1884),III(1885-1891), Imprensa Nacional-Casa da Moeda, Lisboa, 2008-2013

Bibliografia passiva

AZEVEDO, Sara Maria e Souza Marques Pereira, O pensamento pedagógico de Sampaio Bruno A Ideia de Educação para a República, Lisboa, Imprensa Nacional- Casa da Moeda, 2007. Afonso Rocha, Natureza, Razão e Mistério. Para uma leitura comparada de Sampaio Bruno, Lisboa, Imprensa Nacional-Casa da Moeda, 2009

CARVALHO, Amorim de, O Positivismo metafísico de Sampaio Bruno-As influências de Comte e Hartmann. Crítica e Reflexões filosóficas, Lisboa, Sociedade de Expansão Cultural, 1960

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