(12/12/1919 – 05/03/2008)
Autoria: Cecília Barreira
Horizonte geracional
GERAÇÃO DE 1937- Novo Cancioneiro / Neo- Realismo
País
Portugal
Data e local de nascimento
Funchal, 12 de Dezembro de 1919
Formação e acção
Natural da freguesia de Santo António do Funchal, aí conclui o curso liceal. Saiu da Madeira para ingressar na Universidade, licenciando-se em Ciências Histórico-Filosóficas pela Faculdade de Letras da Universidade Clássica de Lisboa.
Actividade desenvolvida
De 1948 a 1972, exerceu a docência em vários liceus cidades nomeadamente no Passos Manuel, em Lisboa.
Após o 25 de Abril exerceu funções docentes na Faculdade de Letras da Universidade Clássica de Lisboa. Foi diretor do Centro de Estudos de História do Atlântico (Madeira), membro do Conselho de Administração da Fundação Calouste Gulbenkian e professor de História na Faculdade de Ciências Sociais e Humanas da Universidade Nova de Lisboa. Esteve durante anos à frente da Coleção dos Livros Horizonte.
Foi um Historiador de renome bastante ligado à escola dos Annales francesa, influenciado por Marc Bloch e Lucien Febvre.
A obra múltipla abrange estudos de cultura de autores muito diversificados. Desde Cesário Verde, Sampaio Bruno, Antero, António Nobre, Oliveira Martins, etc., até Eugénio de Andrade ou autores coetâneos.
Data e local de falecimento
05 de Março de 2008, 88 anos, Sesimbra.
Lema e linha filosófica
Joel Serrão é um Historiador pioneiro e é depositário de um ideal onde existe a liberdade e por outro lado a visão da morte, do fim, da impossibilidade. A sua obra é uma vastidão de temáticas sobre a História Cultural das Mentalidades que ousou entrar em Portugal o negrume dos anos 40, 50 e 60 de novecentos. O vocabulário é rico em lirismo de tão denso que é. A história que elabora é requintada como quando referencia a Noite em oitocentos, sem luz elétrica.
Linha filosófica e caracterização geral da obra
Joel Serrão deixa uma vasta obra publicada com especial incidência nas áreas do Séc. XIX, da cultura e pensamento português, da história contemporânea e sociocultural que aborda de forma pioneira e e vasta.
Na obra Portugueses Somos de 1975 refere;
É que, de facto, é importante – e cada vez mais preciso – que também nos familiarizemos e nos defrontemos com as obras de um Herculano, de um Antero de Quental, de um Oliveira Martins, de um Camilo, de um Raul Proença, de um António Sérgio; que tentemos apreender as grandes linhas do nosso pensamento político na época contemporânea (Portugueses Somos, Livros Horizonte, 1975 p.8).
Estudou como historiador de cultura portuguesa autores como Alexandre Herculano, Oliveira Martins ou Raul Proença.
Trilhou os caminhos de um estudo mais profundo sobre o pensamento político português desde 1820 até 1920. Escrevia:
A primeira dificuldade que se nos depara ante a tarefa do estudo do pensamento político é um problema, digamos, de ordem metodológica, a saber: tal pensamento é isolável do contexto do pensamento em geral? Cortaremos, cerce, o nó górdio afirmando com algum dogmatismo que não, que não é separável de todo um conjunto de raízes mentais e culturais o propósito de pensar ou de repensar a organização e a reorganização da cidade. Em última instância, a política postula uma tomada de posição acerca dos fins da vida humana e acerca do que se deve entender por “homem” e pelo seu bem. As raízes filosóficas, se não religiosas, duma dada elaboração mental de teor político ou estão à vista ou é necessário explicita las. ( Temas de Cultura Portuguesa, Livros Horizonte, 1989 p. 43-44).
E descortina três momentos na História Política portuguesa: o período da “liberdade” de 1820 até 1850; o período da primazia da “igualdade” de 1850 até 1890 e , por fim, de 1890 até 1925, referenciado como “democratismo possível”.
Forjou estudos sobre os grandes vultos da Geração de 70, nomeadamente, Antero, Eça de Queiroz e Oliveira Martins. E a evolução do ideário:
Dir-se-ia, pois, que de 1870 a 1880 se assiste à gradual deslocação do centro de convergência da aspiração democratizante, entre nós: dos objetivos socialistas para os fins republicanos. E, entretanto, a par e passo que o socialismo perde parte da sua anterior virulência, o republicanismo ganha alor, definindo se, a paredes meias com o socialismo, numa vaga aspiração igualitária, que a palavra democracia simboliza e exprime. (…) Por este modo, o republicanismo apelava para a instituição de um regime político que fosse efetivamente nacional- e daqui ao nacionalismo foi um passo fácil de dar se e que se diria necessário, tendo em vista o contexto da realidade portuguesa” (Temas de Cultura Portuguesa, Livros Horizonte, 1989, p.61-62).
Na obra Temas de Cultura Portuguesa- II (1989) Joel Serrão referencia o pensamento sociopolítico de Antero de Quental ou, mais ousadamente um estudo de Antero a Pessoa.
Joel Serrão prezava fazer análises estruturais de fenómenos da cultura. Por exemplo em “A Novelística Social na Década de 1940” envereda por uma problematização onde vai basear se em Herculano, Garrett, Júlio Dinis, Eça, Teixeira de Queirós, Abel Botelho, Fialho de Almeida, Raul Brandão, Aquilino, Ferreira de Castro.
Na mesma obra faz a ligação de Antero a Pessoa e estuda com mais pormenor o pensamento de Vieira de Almeida, seu professor na Faculdade de Letras de Lisboa, filósofo hoje muito esquecido.
Gostava de filosofar acerca da vida e não é por acaso que nos seus escritos estão ideias de um pensamento para além dos ideários:
Somos prisioneiros do tempo e do espaço, realidades físicas como tais mensuráveis, o que, aliás, não interfere na nossa humana experiência do tempo e do espaço, condições por nós mesmos forjadas para nos podermos situar num real- o nosso- de que somos a parte fundamental e constituinte (Temas de Cultura Portuguesa, idem, p. 8)
E , ao alcance deste pensamento, surge uma frase desafiadora que é atual:
(…) A Humanidade é uma só e tenderá, cada vez mais, para a unidade efetiva virtual que nela se contém (Temas de Cultura Portuguesa, idem, p. 9).
E continua:
Mas nenhum de nós é mais do que um momento fátuo, um momentâneo fulgor íntimo, nessa corrida vertiginosa não se sabe bem para onde-acaso para a eternidade do Nada (Temas de Cultura Portuguesa, idem,p. 10).
Na obra Emigração Portuguesa de um modo pueril navega até ao conceito de saudade através dos estudos de Carolina Michaelis de Vasconcelos. Vai mais longe que a estudiosa e refere:
É então que, por volta de 1913, numa linha genealógica que entronca em Junqueiro, em António Nobre e no esoterismo de Sampaio Bruno, Teixeira de Pascoaes busca estruturar uma mundividência portuguesa, cuja matriz seria a Saudade ( Emigração Portuguesa, Livros Horizonte, s/d, p. 128).
E diz sobre os portugueses:
No foro mais íntimo de cada um de nós, nos recessos mais íntimos mesmo dos “ministeriais do progresso” (como gostava de dizer Garrett), espreita um familiar do Santo Ofício, a nostalgia de um purificador auto de fé, um esbirro, um policiador qualquer, que se inquieta sempre que a sua verdade é posta em causa por outra verdade (Emigração Portuguesa, Livros Horizonte, s/d, p.137)
Problematizando a História interroga se sobre a isenção do Historiador tendo em conta a ideologia e como tal não alcançar a objetividade.
Refere o conceito de “intersubjetividade”. Diz que a presença da ideologia está mais presente nas ciências humanas do que nas ciências exatas. As ciências humanas propõem leituras psicológicas, sociológicas, históricas numa tentativa de o Homem se glorificar a si próprio, pensa Joel Serrão. O Tempo seria uma variável muito importante para o Historiador. Também a ideia de Infinito.
Estaríamos sós e desamparados no universo, prisioneiros de um tempo curto, quase um momento, e um espaço. O Homem situa se entre o Bem e o Mal.
Joel Serrão ficou sempre fascinado pelo professor Vieira de Almeida que achava um visionário.
O autor não acreditava em nacionalismos e afirma que os povos do mundo tendem a uma unificação global. Estaria a pensar na globalização através da net? Claro que Joel Serrão, em 1989, quando refletiu sobre estes problemas, estava muito longe da aldeia global digital.
Também gostava, como historiador, de estudar as rotinas das pessoas, dos povos. Em todas as medidas era um sonhador. Um Historiador com prosa poética.
Bibliografia activa
Cartas de Fernando Pessoa a Armando Côrtes-Rodrigues, 1945
O Carácter Social da Revolução de 1383, 1946
Para a História do Século XIX Português, 1953
Cesário Verde: Interpretação, Poesias Dispersas e Cartas, 1957
O Segredo da Aurora, 1957
Sampaio Bruno: O homem e o pensamento, 1959; 1986
Temas Oitocentistas, 1959, 1962
Sampaio Bruno, 1960
Temas de Cultura Portuguesa, 1960
Dicionário de História de Portugal, 1963 – 1971
José Anastácio da Cunha: Notícias Literárias de Portugal: 1780, 1966
António Sérgio: Prosa Doutrinal de Autores Portugueses, 1967
Do Sebastianismo ao Socialismo em Portugal, 1969
Fontes de Demografia Portuguesa (1800-1862), 1973
Portugueses Somos, 1975
Testemunhos sobre a Emigração Portuguesa, 1976
Emigração Portuguesa, 1978
Génese e Estrutura do Pensamento Sócio-Político de Antero de Quental: Introdução a Antero de Quental: Prosas Sócio-Políticas, 1982
O Essencial sobre Cesário Verde: Ensaio e Biografia, 1986
Da “Regeneração” à República, 1990
Temas Históricos Madeirenses, 1992
Pequeno Dicionário de História de Portugal, 1993
Bibliografia passiva
BONIFÁCIO, Maria de Fátima, «Joel Serrão», Dicionário de história de Portugal, vol. IX, coordenação de António Barreto e Maria Filomena Mónica, Porto, 2000, pp. 416-417
MENDES, J. Amado, «Para uma nova visão da história de Portugal: o Dicionário de Joel Serrão e a História de Portugal de Oliveira Marques», in Fernando Catroga, Luís Reis Torgal e J. Amado Mendes, História da história em Portugal. Sécs. XIX-XX, [s.l.], Círculo de Leitores, 1996, pp. 318-320
SOUSA, José de. “SERRÃO, Joel: Para uma Nova Visão da História de Portugal” in Dicionário de Historiadores Portugueses/ Da Academia Real das Ciências ao Final do Estado Novo. http://dichp.bnportugal.pt/historiadores/historiadores_serrao10.htm
Webgrafia:
http://bmfunchal.blogs.sapo.pt/22390.html