(25/10/1881 – 08/04/1973)
Autoria: Teresa Lousa
Horizonte geracional
GERAÇÃO DE 14
País
Espanha
Data e local de nascimento
Málaga, 25 de Outubro de 1881
Formação e acção
Pablo Picasso nasceu em Málaga, pequena cidade da Andaluzia, no sul da Espanha, no seio de uma família burguesa. O seu pai era pintor naturalista e professor de Desenho. Em 1891 a sua família muda-se para a Corunha.
A partir de 1892, Pablo frequenta os cursos de desenho de ornamento ministrados pelo próprio pai e, dois anos mais tarde, outros cursos: cópia de gesso, desenho da figura, pintura e cópia a partir de modelo. Começa a frequentar o ensino académico a partir de moldes em gesso de estátuas antigas, mas paralelamente desenha de forma mais livre e espontânea. Revela uma grande precocidade, própria de um talento fora do comum. A oportunidade de obter uma aprendizagem académica em tão tenra idade vai contribuir certamente para aprimorar esse talento e desenvolver a sua genialidade.
O seu pai é nomeado professor na Escuela de Artes y Ofícios de Barcelona chegando aí a obter a cátedra. É precisamente nessa escola que Picasso ingressa os seus estudos artísticos académicos, mas na realidade este artista muito cedo começou a interessar-se pela arte, que se saiba aos sete anos de idade, já desenhava com destreza a lápis e recebia orientações de seu pai, que foi seu primeiro professor e o introduziu na técnica da pintura a óleo.
Em 1897 o seu pai percebeu que deveria levar a sério o talento do seu filho e enviou-o para a Madrid onde se matriculou na Academia São Fernando. Picasso considerava este tipo de ensino demasiado rígido e acabou por abandonar a Academia para grande desilusão do seu pai. O tempo passado em Madrid foi sobretudo proveitoso pelo grande conhecimento dos mestres El Greco e Velasquez que as visitas frequentes ao Museu do Prado proporcionaram.
Quando volta a Barcelona, em 1899, instala-se num atelier situado na Rua dos Escudillers. Barcelona será o palco de uma grande expansão económica e artística: a indústria enriquece uma burguesia que, ao tomar consciência de seu valor, investe nos artistas e os poetas. Assim se desencadeia o apogeu do “modernismo” catalão. Também por esta altura começa a frequentar os cafés onde se reuniam os artistas locais e a ter uma consciência política através da ideologia anarquista e da observação da pobreza reinante nos bairros pobres da cidade, aspecto que irá influenciar a sua pintura na “fase azul”.
Actividade desenvolvida
Para além da sua dedicação apaixonada à arte, em 1899 Picasso entra em contacto com a ideologia anarquista e começa a inquietar-se com questões sociais e políticas.
Entre 1901 e 1904 a sua residência oscilou entre Madrid, Barcelona e Paris, época em que desenvolve a sua fase azul, uma gama cromática que remete à melancolia e à preocupação com as grandes causas sociais. Em 1904 muda-se para Paris, cidade que é nesta altura o centro do mundo em termos artísticos e constitui simultaneamente para um artista a oportunidade de aprender, de expor e de dar nas vistas entre tantas galerias, salões e marchands de arte.
Em 1907 a sua arte sofre a influência decisiva da arte e cultura africana, influência que será responsável por inspirar em Picasso experiências novas e ousadas que desembocarão no cubismo. O envolvimento com a vida boémia e as diferentes nuances das vanguardas ditarão uma diversificada produção artística: período africano, cubismo analítico, cubismo sintético, classicismo, surrealismo, etc.
Em 1925 a sua obra sofre uma mudança radical com a influência dos poetas surrealistas, participando em 1925 na primeira exposição surrealista da Galerie Pierre.
Expressou publicamente a sua simpatia pelas ideias anarquistas e comunistas e através da arte manifestou a sua oposição relativamente a Franco e ao Fascismo. De modo consistente Picasso, como pacifista, recusou-se a tocar em armas na Primeira Guerra Mundial, na Guerra Civil Espanhola e na Segunda Guerra Mundial.
No começo da Guerra Civil Espanhola (1936-1939) foi nomeado Director de Museu do Prado. Por esta altura também representará todo o horror da guerra na sua colossal pintura “Guernica”, pintando depois a sua famosa série de Pombas da Paz (no ano de 1949, ano em que nasce também a sua última filha que receberá oportunamente o nome de Paloma). Pelo seu envolvimento com esta causa e resistência pacifista, Picasso receberá o prémio internacional da Paz de 1955.
Paralelamente à pintura Picasso desenvolveu também múltiplas obras de escultura. Talvez o facto de nunca ter estudado academicamente escultura tivesse permitido que se libertasse ainda mais de condicionalismos e regras e se dedicasse de forma livre e ousada com uma linguagem experimental. Durante mais de seis décadas – de 1902 a 1964 Picasso desenvolveu esculturas ímpares e absolutamente geniais utilizando materiais como o gesso, a argila e o bronze – mas também outros menos usuais na época, como madeira, papel, cartão, areia e objetos comuns, revelando sempre o seu espírito precursor. “A escultura é o melhor comentário que o pintor pode fazer à sua pintura” dirá Picasso[1].
Há ainda que destacar uma actividade que desenvolveu mais tardiamente, a cerâmica. A partir do final dos anos 40 até pelo menos 1971, perto da sua morte, modelou várias figuras, touros, figuras zoomórficas, mosaicos, vasos, jarros, etc.
Na sua produtividade artística podemos ainda incluir a gravura, a fotografia e a escrita, em particular a poesia que o acompanhará toda a vida.
Data e local de falecimento
Mougins, 8 de Abril de 1973
Lema e linha filosófica
Picasso é um dos maiores génios do séc. XX, com uma obra artística gigantesca, que constantemente reinventa. A sua produção se de início comprometida com as vanguardas europeias, atinge na maturidade o apogeu e o desenvolvimento na expressão de um estilo intenso, inquieto, único e inconfundível.
Linha filosófica e caracterização geral da obra
Mesmo que pela sua idade se possa incluir Picasso na geração de 1914, (ou na Escola de Madrid, segundo a definição de Julián Marías), o seu percurso artístico supera em muito qualquer enquadramento. A pintura de Picasso poderia corresponder à expressão das teorias estéticas de Ortega y Gasset sobre a “desumanização da arte”. Sem dúvida que o seu rompimento com o carácter mimético e o desenvolvimento de uma arte cada vez mais elitista e menos acessível a um público não esclarecido, nos permite fazer essa associação, apesar de Picasso nunca ter abandonado a figuração e não ter manifestado especial apreço pela abstração.
Em torno do Cubismo algumas questões estéticas se podem colocar, e que são também as grandes questões fenomenológicas que Picasso colocou através da sua criação artística sobretudo a partir da sua ida para Paris: Como representar simultaneamente várias perspectivas do mesmo objecto na tela? Picasso para além de tentar representar vários pontos de vista do mesmo objecto, conseguirá a proeza de representar sobretudo o ponto de ruptura com a perspectiva convencional, revolucionando assim definitivamente a arte, naquilo que se poderia chamar uma revolução copernicana artística já que deixou de haver um centro ou um ponto de vista privilegiado.
Os eixos temáticos da sua arte reflectiram algumas linhas de investigação: o Cubismo e o seu trajecto até ao Surrealismo; as influências do Classicismo e da arte greco-romana; a resistência às Guerras e a representação da violência e do primitivismo, a crítica ao nazismo e ao franquismo. Os horrores da guerra e a contribuição de Picasso para a paz traduzem-se nas relações ético-estéticas, incluindo o diálogo que potenciou entre artistas, políticos e intelectuais. Dos seus eixos temáticos há também que destacar um gosto pelos temas espanhóis que nunca abandonou apesar da sua internacionalização.
Do ponto de vista ético a intersubjetividade e as causas sociais constituem uma presença dominante na obra de Picasso: os pobres, os excluídos, as vítimas inocentes, os mais frágeis, as marginalizados etc. Este tema está bem representado na época azul, especialmente votada à melancolia, mas também se pressente na inocência dos personagens do circo, característica da época rosa.
Há ainda que destacar uma actividade que desenvolveu ao longo de toda a sua vida: a Poesia (e também a Prosa e os textos para teatro), onde paralelamente às artes visuais expressou as suas ideias e sentimentos. Nos seus escritos revela a alma espanhola marcadamente malaguenha, assim como apresenta notas que variam entre uma linguagem surrealista (livre, incontrolável e automática) e expressionista. Num estilo diversificado próprio de um caleidoscópio cubista e sem qualquer rigidez lógico-formal, inclusive na recusa das normas de pontuação e de gramática, Picasso vai registando o seu pensamento tal como fez na sua restante obra.
Por fim, não tendo Picasso desenvolvido um pensamento filosófico e deixando a sua obra um legado bastante caleidoscópico de ideias e inquietações, podemos dizer que a sua obra artística constitui um premente convite à reflexão que recupera de certa maneira o sentido hegeliano de Estética. Como dizia Picasso “a pintura não foi feita para enfeitar paredes”. Picasso dará um contributo fulgurante para a consciencialização da autonomia da arte, para a crescente convicção de que a arte consiste numa ciência, numa atitude de resistência, na manifestação de ideias e conceitos, na manifestação do espírito, na expressão dos sentimentos do humano, no seu sentido lato e universal.
Bibliografia activa
PICASSO, Pablo. Sueño y Mentira de Franco. Paris. 1937.
PICASSO, Pablo. “Pourquoi je suis Communiste”. L’Humanité. (29-30 October). 1944
PICASSO, Pablo. Picasso, poemas y declaraciones. México: Darro y Genil. 1944
PICASSO, Pablo. Le Désir attrapé par la queue. Paris: Gallimard. 1945.
PICASSO, Pablo. Les Quatre Petites Filles. Paris: Gallimard. 1968.
PICASSO, Pablo. El Entierro del Conde de Orgaz. Barcelona: Gustavo Gili. 1980
PICASSO, Pablo, Textes Españoles (1894- 1968), Edição de Rafael Inglada, Málaga: Las 4 Estaciones, 2006
PICASSO, Pablo. Poemas en Prosa. Barcelona: Plataforma, 2008;
PICASSO, Pablo. El Deseo Atrapado por la Cola. Madrid: Circulo de Bellas Artes, 2009
PICASSO, Pablo. Trozo de Piel, Malaga, Instituto Municipal del Libro, área de Cultura, Ayuntamiento de Málaga, D., 2009
Bibliografia passiva
ARGAN, Giulio Carlo. A Arte Moderna na Europa: de Hogarth a Picasso. São Paulo: Companhia das Letras, 2010
Asthon, D. Picasso, London, Thames and Hudson, 1972
—, Picasso on art, a selection of views, New York, Da Capo Press, 1972
BOECK, Wilhem. Picasso. Barcelona: Editorial Labor S. A., 1958.
BOIS, Yve-Alain. Matisse e Picasso. São Paulo: Companhia Melhoramentos, 1999.
CABANNE, P, Le sciècle de Picasso- La naissance du Cubisme (1881- 1912) Paris, Gallimard, 1992
COWlING, E, Picasso- Style and meaning, London, Phaidon, 2002
HOKNEY, D. Picasso, Paris: Daniel Lelong, 1999
FERMIGIER, André (1969). Picasso. [S.l.]: Le Livre de Poche, Série Art. – Librairie Génerale Française
MALLEN, Enrique. “La poesía simpatética de Pablo Picasso”. Picasso-Poesie-Poetik. Ed. by Nanette Rißler-Pipka & Gerhard Wild. Aachen: Shaker Verlag. 2012
NEIL, Cox e Deborah Povey. A Picasso Bestiary. London: Academy Editions, 1995.
KRAUSS, Rosalind E. Os papéis de Picasso. São Paulo: Iluminuras, 2006.
SCHAPIRO, Meyer. A unidade da arte de Picasso. São Paulo: Cosac & Naify Edições, 2002.
STEIN, Gertrude. Picasso. Madrid: La Esfera, 2002
[1] Picasso apud J. P. A. Calosse, Picasso, Parkstone International, 2011, p. 63