RAUL SANGREMAN PROENÇA

(1884 – 1941)

Autoria: Júlio Silva

Horizonte geracional

GERAÇÃO DE 1912

País

Portugal

Data e local de nascimento

10 de Maio de 1884, Caldas da Rainha

Formação e acção

Raúl Sangreman Proença nasce nas Caldas da rainha a 10 de Maio de 1884, o pai Jaime Augusto de Carvalho Proença é um funcionário público das Finanças, republicano e natural das Caldas da Rainha. Frequenta a instrução primária primeiro em Alcobaça e depois em Leia onde faz o exame de instrução primária. No ano lectivo de 1894-1895 inicia os estudos secundários no Liceu José Falcão em Coimbra transferindo-se no ano lectivo de 1896-1897 para o Liceu Central do Carmo em Lisboa. Inscreve-se no ano lectivo de 1902-1903 no Instituto Industrial e Comercial de Lisboa, tendo concluído o curso em 1905 A preocupação com as questões pedagógicas leva-o a enveredar no ano de 1905-1906 pela carreira de professor na Escola Comercial de Faro que abandonará no ano lectivo seguinte para se dedicar ao ensino particular em Alcobaça.

Regressando a Lisboa em 1908 adere à Liga de Educação Nacional, publicando conjuntamente com outros intelectuais um manifesto que dá prioridade à reforma do ensino secundário. Não será de estranhar o seu apoio público à Liga Nacional de Instrução criada igualmente em 1908 e responsável por dois Congressos Pedagógicos. A militância política republicana está sempre presente nos artigos publicados em vários jornais e no lançamento do jornal República em Alcobaça em 1908 de curta duração. Em 1909 desloca-se para Lisboa e torna-se jornalista profissional na Vanguarda de Magalhães Lima, na República de Artur Leitão e na Alma Nacional de António José de Almeida em 1910. Neste mesmo ano, torna-se sócio ordinário da Sociedade de Geografia, passando a fazer parte da elite intelectual e científica do país.

O triunfo republicano no 5 de Outubro de 1910 não melhorou a sua situação profissional, sendo incapaz de se adaptar as novas exigências de um jornalismo marcado pelo predomínio do acontecimento político quotidiano. Em 1911 é nomeado 2.º conservador Biblioteca em Lisboa tomando posse em Fevereiro do ano seguinte, tornando-se 1.º Bibliotecário em 1917. Entre 1918 e 1924 procederá à uniformização das regras de catalogação nacionais a pedido. No entanto, a grande mudança inicia-se com a sua colaboração na 1.ª Série da revista Águia (1910-1911) e nos Serões (1911?) relacionando-se com Jaime Cortesão, Teixeira de Pascoaes e António Sérgio componentes essenciais de uma nova geração de intelectuais. A relação de amizade com António Sérgio leva-o a aderir ao projecto da associação de intelectuais da Renascença Portuguesa ainda em 1911, acompanhando posteriormente na sua ruptura com o grupo do norte encabeçado por Teixeira de Pascoaes.

Defensor da participação portuguesa na Primeira Guerra Mundial vai alistar-se em meados de 1918 no Exército, na Escola Prática de Oficiais Milicianos em Mafra, tendo o conflito militar terminado antes de poder ser enviado para a França. A revolta monárquica de 1919 leva-o a participar activamente na defesa da República participando na “escalada de Monsanto” em Lisboa e na expedição militar contra a Monarquia do Norte. Ainda em 1918 adere à Liga de Acção Nacional de António Sérgio e colabora na revista Pela Grei até à sua extinção em 1919. Membro do grupo fundador da Seara Nova, criada em 1921 por iniciativa de António Sérgio será um dos seus mais activos colaboradores até à sua morte em 1941. Estará associado às posteriores intervenções políticas dos seareiros nomeadamente o Grupo de Propaganda e Acção (1921) e a União Cívica (1923). Adversário da Ditadura nacional resultante do golpe de estado de 28 de Maio de 1916 participará activamente na revolta falhada dos republicanos de Fevereiro de 1927, sendo obrigado deixar o país. No exílio continuará a actividade oposicionista em colaboração com as diversas tendências republicanas e simultaneamente a reflexão filosófica e política, colaborando em diversos periódicos. A expulsão em 1927 da Biblioteca Nacional, as enormes dificuldades financeiras e a progressiva desilusão com sobrevivência do regime terão contribuído para o agravamento da doença mental. O regresso em 1932 é o resultado dos problemas psicológicos de que sofre não o vão abandonar até morrer, embora não o incapacitando totalmente e permitindo-lhe uma intermitente actividade intelectual.

Actividade desenvolvida

Raúl Proença foi activista político, jornalista e escritor, tendo abordado temas filosóficos, políticos e sociais e colaborado em numerosos jornais e revistas. A sua vida foi marcada por uma estreita adesão aos ideais republicanos, embora desenvolvesse um distanciamento crítico face às deficiências e erros da Primeira República Portuguesa. Foi igualmente bibliotecário, tendo contribuído para a reforma da Biblioteca Nacional. Concorreu de forma decisiva para o incremento do turismo em Portugal através da publicação do Guia de Portugal. No final da sua vida opôs-se vigorosamente à implantação do Estado Novo, morrendo em 1941.

Data e local de falecimento

20 de Maio de 1941, (57 anos) Porto

Lema e linha filosófica

A formação filosófica de Raúl Proença foi marcada pelo positivismo monista e evolucionista de Teófilo Braga que rapidamente abandona em prol de um espiritualismo vitalista e voluntarista. O racionalismo crítico será uma forma de reequilibrar esta tendência inicial do seu pensamento procurando uma maior equilíbrio entre o culto da vida e o culto da razão.

Linha filosófica e caracterização geral da obra

A reflexão filosófica de Raúl Proença está estreitamente ligada à elaboração do seu pensamento político, subordinado ao objectivo de operar uma reforma das mentalidades das elites nacionais e formar uma opinião pública capaz de impor à classe política um conjunto de reformas institucionais, económicas e educativas do país. Assim sendo, o seu pensamento filosófico dispersa-se na análise de diferentes temas unidos por uma mesma preocupação ética, sem existir um desejo de sistematização e aprofundamento com excepção do Eterno Retorno.

O primeiro trabalho filosófico do autor intitula-se “Esboço do Positivismo” (1905) realiza uma síntese das principais teses de Teófilo Braga, defendendo que a filosofia positivista não se esgota numa dimensão intelectualista, devendo harmonizar a vida pensante com a vida sentimental e a vida activa. Entre 1905 e 1909, Proença vai atenuando progressivamente o seu inicial ateísmo cientista e anti-religioso abrindo-se a uma epistemologia do relativismo da verdade científica mais kantiana que positivista. Será entre Março e Setembro de 1910, no semanário Alma Nacional, que irá assentará os alicerces do seu espiritualismo vitalista e voluntarismo temperado de racionalismo crítico. O longo ensaio sobre a teoria do Eterno Retorno (redigido em 1916 e reelaborado em 1938-1939) vai torná-lo uma das mais importantes figuras do ensaísmo filosófico e, o mais importante conhecedor de Nietzsche da primeira metade do século XX português. Durante a sua vida, apenas publicou o capítulo 1 e partes dos capítulos III e V, nas revistas A Águia (1917), Atlântida (1918) e na Revista de Portugal (1940). Entre 1916 e 1938 só muito raramente aborda temas de natureza filosófica e em 1922 e 1925 em dois artigos o problema da existência de Deus e a sua incidência na ética de vida. Em 1940, abordará, também na Seara Nova, o problema do cristianismo.

A acção política do militante republicano, a adesão ética a um ideal democrático e posteriormente socialista vai conduzi-lo a uma defesa do liberalismo político em oposição ao liberalismo económico e uma concepção do socialismo como um corolário da democracia. Nesta perspectiva, assume não existir contradição entre o individualismo integral do pensamento liberal e a socialização do poder ao serviço dos cidadãos, permitindo a realização de uma democracia igualitária ou de um “socialismo liberal”. A teoria do Estado de Raúl Proença centra-se no desenvolvimento progressivo da cultura e da justiça, tendo como base o controlo democrático do poder.

Bibliografia activa

Os Sinos (Poesia narrativa), Alcobaça, 1908.

A Biblioteca Nacional (breves noções históricas e descritivas) (com prefácio de Fidelino de Figueiredo e um ensaio de Bettencourt de Atáide), Lisboa, Publicações da Biblioteca Nacional, 1918.

Seara Nova, Revista Quinzenal de Doutrina e Crítica, Lisboa, Seara Nova, 1921-?

Guia de Évora e Seus Arredores: Especimen do Guia de Portugal, Lisboa, Oficinas Gráficas da Biblioteca Nacional de Lisboa, 1923.

Guia de Portugal, Vol. 1.º, Generalidades – Lisboa e Arredores, Lisboa, Biblioteca Nacional, 1924.

Guia de Portugal, Vol. 2.º, Estremadura, Alentejo e Algarve, Lisboa, Biblioteca Nacional, 1927.

Panfletos – I. A Ditadura Militar: História e Análise de Um Crime, Lisboa, 1926.

Panfletos – II. Ainda a Ditadura Militar: Demonstração Científica da Nocividade das Ditaduras Militares, e Algumas Amabilidades Sobresselentes, Lisboa, 1927.

Lisboa: Enciclopédia pela imagen, Porto, Lello e Irmão, 1929.

Portugal, Madére-Iles Açores, in Les Guides Bleus, Paris, Librairie Hachette, 1931.

Estradas de Portugal, tomo 1 – Estradas dos Arredores de Lisboa, Porto, Lello, s/d.

Estradas de Portugal, tomo 2 – Estradas do Minho, Porto, Livraria Lello, s/d.

Estradas de Portugal, tomo 3 – Estradas de Lisboa ao Porto, Porto, Livraria Lello, s/d.

Estradas de Portugal, tomo 4 – Estradas da Beira Meridional, Porto, Livraria Lello, s/d.

Estradas de Portugal, tomo 5 – Estradas da Beira Setentrional, Porto, Livraria Lello, s/d.

Estradas de Portugal, tomo 6 – Estradas do Alto Alentejo, Porto, Livraria Lello, s/d.

Estradas de Portugal, tomo 9 – Estradas do Douro e Tras-os-Montes (em colabração com Sant’Anna Dionísio), Porto, Livraria Lello, s/d.

Páginas de Política, 1.ª série, com prefacio de Câmara Reis, Lisboa, Seara Nova, 1938.

Páginas de Política, 2.ª série, Lisboa, Seara Nova, 1939.

Acerca do Integralismo Lusitano (com prefacio de Manuel Mendes), Lisboa, Seara Nova, 1964.

Obra Política de Raúl Proença, vol. I, Páginas de Política (1), Lisboa, Seara Nova, 1972.

Obra Política de Raúl Proença, vol. II, Páginas de Política (2), Lisboa, Seara Nova, 1972.

Obra Política de Raúl Proença, vol. III, Páginas de Política (3), Lisboa, Seara Nova, 1974.

Obra Política de Raúl Proença, vol. IV, Páginas de Política (4), Lisboa, Seara Nova, 1975.

O Eterno Retorno, vol.s I e II, introdução, fixação do texto e notas de António Reis, Lisboa, Biblioteca Nacional e INCM – Biblioteca Nacional, 1987 e 1994.

O Caso da Biblioteca, organização, estudos e notas de Daniel Pires e José Carlos González, Lisboa, Biblioteca Nacional, 1988.

Polémicas, organização, prefacio e cronología de Daniel Pires, Lisboa, Publicações Dom Quixote, 1988.

Bibliografia passiva

Baptista, Jacinto, Jaime Cortesão, Raúl Proença: Idealistas do Mundo Real, Lisboa, Biblioteca Nacional, 1990.

Comissão Executiva das Comemorações do Centenário de Raúl Proença, Raúl Proença: 1884-1984, Caldas da Rainha, 1984.

Dionísio, Sant’Anna, O pensamento Especulativo e Agente de Raúl Proença, Lisboa, Seara Nova, 1949.

Garção, João Francisco Venâncio, O Pensamento Político-Social Pré-Seareiro de Raúl Proença, dissertação de mestrado, Coimbra, FLUC, 1994.

Meneses, Bourbon e, Proença furioso e lastimoso ou a megalomanía de um messias sem juízo: subsídio anedótico para a história da «Seara Nova» e dalguns pardais», Lisboa, 1931.

Miguéis, José Rodrigues, Uma Flor na Campa de Raúl Proença, Lisboa, 1985.

Natário, Maria Celeste, O Pensamento Filosófico de Raúl Proença, Tese de Doutoramento de Filosofia, Porto, Universidade do Porto, 2002.

Natário, Maria Celeste, O Pensamento Filosófico de Raúl Proença, Lisboa, INCM, 2005.

Pedroso, Alberto, Raúl Proença Panfletário e Jornalista de folhas Clandestinas, Lisboa, 1984.

Prista, Luís, Para a Edição do Guia de Portugal, dissertação de mestrado em Lingüística Portuguesa Histórica, Lisboa, Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa, 1992.

Reis, António, Raúl Proença – Estudo e Antologia, colecção «Testemunhos Contemporâneos», n.º 19 (direcção de António Reis), Lisboa, Publicações Alfa, 1990.

Reis, António, Raúl Proença. [Texto Policopiado] Biografia de um Intelectual Político Republicano, 2 vol.s, Tese de Doutoramento de História Cultural e das Mentalidades, Lisboa, Universidade De Lisboa, 2000.

Reis, António, Raúl Proença. Biografia de um Intelectual Político Republicano, 2 vol.s, Lisboa, INCM, 2003.

Reis, Câmara, Raúl Proença, Lisboa, Biblioteca Nacional, 1985.

Santos, Fernando Piteira, Raúl Proença e a «Alma Nacional»: da colaboração com António José de Almeida à ruptura, Mem Martins, Publicações Europa-América, 1979.